A Reforma Tributária já não é mais uma promessa em discussão — é uma realidade em implementação. Desde a aprovação das leis complementares e o início das medidas preparatórias, o Brasil vive uma das maiores reestruturações fiscais de sua história.
O novo sistema: integração total e cobrança em tempo real
O coração da Reforma está na substituição dos tributos sobre consumo (ICMS, ISS, PIS e COFINS) por dois novos impostos: o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), de competência compartilhada entre estados e municípios, e a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), de competência federal. Juntos, formam o modelo dual de IVA, que alinhará o Brasil às práticas tributárias mais modernas do mundo.
A principal inovação, porém, não é apenas a unificação das bases tributáveis — mas a digitalização integral da arrecadação. Com a adoção do Split Payment, o pagamento dos tributos será realizado automaticamente no ato da transação financeira, eliminando etapas intermediárias e reduzindo o risco de inadimplência.
Essa automação tornará o sistema autofiscalizável, uma vez que cada operação comercial será registrada, validada e tributada em tempo real, sem depender do recolhimento posterior pelo contribuinte.
O cronograma até 2033: da fase de testes à extinção dos tributos atuais
A transição ocorrerá de forma escalonada, garantindo que o novo sistema possa ser testado e ajustado antes da consolidação definitiva:
- 2026: início da fase de testes, com cobrança simbólica de 1% sobre o faturamento (0,9% CBS e 0,1% IBS), compensável com créditos de PIS/COFINS.
- 2027: início da cobrança efetiva do Imposto Seletivo (IS) e ampliação da integração eletrônica de dados.
- 2028: unificação tecnológica e fase ampliada de testes do Split Payment.
- 2029–2032: migração progressiva de ICMS e ISS para o IBS, em percentuais crescentes (10% → 20% → 30% → 40%).
- 2033: extinção completa dos tributos anteriores e plena vigência do novo regime.
Esse cronograma foi concebido para permitir que empresas, estados e municípios se adaptem com segurança, sem comprometer arrecadação ou operações empresariais.
Impactos estruturais para as empresas
O novo modelo exigirá mudanças profundas na governança tributária e nos sistemas de gestão. As companhias terão que garantir a compatibilidade de seus ERPs, emissores fiscais e módulos contábeis com as novas obrigações eletrônicas — especialmente no que se refere à integração automática com a Receita Federal e os fiscos estaduais e municipais.
Além da atualização tecnológica, haverá impactos diretos em:
- Fluxo de caixa: o recolhimento imediato do imposto no Split Payment altera o ciclo financeiro das empresas e demanda novo planejamento de capital de giro.
- Contratos comerciais: cláusulas de preço e crédito tributário precisarão ser revistas, especialmente nas relações entre empresas do Simples Nacional e do Lucro Real.
- Compliance e auditoria: o cruzamento automático de dados entre notas fiscais, declarações e transações bancárias reduzirá o espaço para erros, mas exigirá monitoramento constante.
- Planejamento tributário: regimes e incentivos regionais passarão por revisão e serão gradualmente centralizados no Cadastro Nacional de Benefícios Fiscais (CBENEF).
O papel da tecnologia e da inteligência fiscal
Na visão de Erick Pomin, a reforma inaugura uma nova era de interoperabilidade tributária, em que tecnologia e conformidade caminham juntas. Ferramentas de inteligência fiscal e automação de compliance deixarão de ser diferenciais e se tornarão requisitos básicos de operação.
A Receita Federal e as Secretarias Estaduais já avançam na integração entre NF-e, NFS-e, EFD-Contribuições, DCTFWeb e o futuro DCTF Unificado. Essa convergência permitirá que o Fisco acompanhe cada etapa da cadeia produtiva em tempo real, identificando inconsistências automaticamente — um movimento que deve reduzir fraudes, mas também elevar a responsabilidade das empresas quanto à qualidade das informações declaradas.
Governança tributária e cultura de conformidade
Com a extinção gradual dos regimes cumulativos e a simplificação das bases de cálculo, a governança tributária ganha um novo papel: garantir previsibilidade e segurança jurídica na operação. Isso exige uma mudança cultural nas empresas — do modelo reativo, voltado ao cumprimento de obrigações, para um modelo proativo, de controle integrado e gestão antecipada de riscos.
Empresas que ainda tratam o tema tributário apenas como função contábil precisarão evoluir para uma abordagem de governança estratégica, em que a área fiscal participe ativamente das decisões de precificação, logística e expansão.
Setores mais impactados e desafios imediatos
Os setores de serviços, varejo digital, energia, combustíveis e bebidas sentirão os efeitos da reforma mais rapidamente, pois suas cadeias possuem incidência tributária complexa e alto volume de notas fiscais. A exigência de adaptação imediata de sistemas e o novo modelo de creditamento podem gerar desafios operacionais relevantes.
Já as micro e pequenas empresas precisarão avaliar cuidadosamente a manutenção no Simples Nacional. Com a perda de aproveitamento de créditos por parte dos clientes, muitos contratos poderão se tornar menos competitivos, exigindo reposicionamento estratégico.
Como se preparar
A recomendação central é clara: antecipar a adequação ainda em 2025. Isso envolve:
- Atualizar sistemas e validar integração com os novos campos de IBS, CBS e IS;
- Revisar contratos e cláusulas de crédito tributário;
- Mapear operações com regimes monofásicos e cumulativos em extinção;
- Implementar políticas internas de auditoria fiscal digital;
- Treinar equipes contábeis e financeiras sobre o modelo de split payment.
Para apoiar esse processo, a Solutta estruturou iniciativas como o Mapa da Reforma Tributária, o Checklist de Adequação 2026 e a Jornada da Reforma, que combinam diagnóstico, simulação de cenários e capacitação técnica.
Um novo ciclo de maturidade fiscal
A consolidação da Reforma Tributária representa mais do que uma mudança legal — é o início de um ciclo de maturidade fiscal corporativa. O ambiente tributário brasileiro passará a operar com base em dados, interoperabilidade e conformidade preditiva.
As empresas que enxergarem esse movimento como oportunidade estratégica — e não apenas como obrigação — terão vantagem competitiva real: menos contingências, maior previsibilidade e um relacionamento transparente com o Fisco.O futuro tributário do país começa a ser testado em 2026. A questão é: sua empresa estará pronta quando o sistema deixar de ser teste e passar a valer de fato?