A contagem regressiva começou. Faltam apenas 75 dias para a entrada em vigor da primeira etapa prática da Reforma Tributária, e 2026 já desponta como o ano de testes que colocará à prova não apenas o novo sistema fiscal do país, mas também a capacidade das empresas de se adaptar rapidamente a um modelo tributário totalmente digital, integrado e automatizado.
Enquanto o governo testa a engrenagem operacional do IBS e da CBS, o setor privado enfrenta um desafio imediato: garantir que seus sistemas, contratos e processos estejam compatíveis com as novas exigências até dezembro de 2025. O que parecia distante agora se tornou um cronômetro que corre contra o tempo — e cada dia de atraso pode significar risco real de paralisação nas emissões fiscais e de perda de créditos tributários.
2026: o ano de testes que definirá o futuro tributário
Janeiro de 2026 marcará o início da fase piloto do novo sistema de tributos sobre o consumo, com cobrança simbólica de 1% sobre o faturamento (0,9% CBS + 0,1% IBS). O valor será compensável com créditos de PIS/COFINS, desde que a empresa cumpra integralmente suas obrigações acessórias.
O principal foco dessa etapa é testar a interoperabilidade dos sistemas de emissão de notas fiscais, os mecanismos de cruzamento eletrônico de dados e o comportamento operacional das empresas diante de um modelo fiscal em tempo real. Na prática, o governo vai avaliar se o ecossistema tecnológico empresarial está preparado para a transição definitiva ao IVA dual, que começa a se consolidar a partir de 2027.
Mas o ponto crítico é que a “fase de testes” já começou — de forma silenciosa. Desde 13 de outubro de 2025, os novos campos de IBS e CBS já estão habilitados na NF-e e na NFC-e. O período de validação segue até dezembro, e, a partir de 1º de janeiro de 2026, todas as notas deverão conter os novos campos, mesmo que o preenchimento ainda não seja obrigatório. Notas emitidas em versões antigas correm o risco de serem rejeitadas pelo sistema, travando processos de venda e compra.
O elo fraco da cadeia: fornecedores e softwares fiscais
O sucesso da transição depende diretamente dos fornecedores de sistemas emissores. Cada software precisa estar adaptado à Nota Técnica 2025.002, que atualiza o layout das notas fiscais para comportar os tributos da reforma. Empresas que ainda não confirmaram com seus provedores a atualização correm risco operacional iminente.
Especialistas recomendam três ações imediatas:
- Confirmar com o fornecedor se o ERP e o emissor de NF já suportam IBS e CBS.
- Realizar testes de emissão ainda em 2025, simulando operações reais.
- Validar os arquivos XML antes do fechamento contábil, garantindo que não haverá rejeição em janeiro.
O atraso na atualização pode provocar paralisação temporária de emissões fiscais, comprometendo o faturamento logo nos primeiros dias do novo regime.
Serviços, ICMS e mudanças paralelas: ajustes que acontecem ao mesmo tempo
A adaptação não se limita às empresas industriais ou comerciais. A partir de janeiro de 2026, a Nota Fiscal de Serviço Eletrônica Nacional (NFS-e) passará a ser obrigatória em todos os municípios e no Distrito Federal. A Nota Técnica SE/CGNFS-e nº 002/2025 estabeleceu o novo layout, já integrado aos tributos da reforma (IBS e CBS). Cada prefeitura precisará alinhar seus sistemas, mas cabe às empresas garantir a compatibilidade com o novo padrão nacional.
Paralelamente, outros ajustes técnicos ocorrem:
- Atualizações de Margem de Valor Agregado (MVA) e Valor de Substituição Tributária (VST);
- Inclusão de novos campos para o Imposto Seletivo e operações monofásicas;
- Integração automática de eventos fiscais nas NF-e e NFS-e;
- Sincronização entre ERP, contabilidade e emissão fiscal para validação cruzada de dados.
No plano estadual, São Paulo substituirá a GNRE pelo DARE-SP para recolhimento do ICMS de importação. Empresas com grande volume de DIR (código 12007) devem revisar rotinas e processos até o fim de 2025, pois o sistema Integrador Comex-DARE já está disponível e será obrigatório a partir de janeiro.
Fiscalização automatizada e o fim do “emite nota, calcula depois”
Com o artigo 348 da Reforma, o cumprimento das obrigações acessórias será critério direto para a dispensa do recolhimento simbólico de 1%. Isso significa que qualquer erro de integração, rejeição de nota ou inconsistência poderá gerar cobrança automática. A Receita Federal testará, em tempo real, não apenas o cálculo dos tributos, mas a capacidade das empresas de operar corretamente dentro do novo modelo.
Além disso, entra em cena o Split Payment, conhecido como “Pix dos Impostos”. Nesse formato, o imposto será retido diretamente na transação bancária, no momento do pagamento. O modelo elimina o antigo processo de apuração e recolhimento posterior, alterando completamente o fluxo de caixa das empresas e exigindo uma nova gestão de capital de giro e precificação.
Reorganização contratual: o novo mapa das relações comerciais
Com a Reforma, empresas optantes pelo Simples Nacional deixam de gerar crédito tributário para o cliente, o que muda radicalmente a lógica de formação de preços e contratos. Para muitas companhias, o Lucro Real pode se tornar mais vantajoso, mesmo com alíquotas nominais mais elevadas.
A recomendação é clara:
- Revisar contratos e regimes tributários com fornecedores e clientes;
- Simular cenários de custo real entre os regimes (Simples x Lucro Real);
- Reavaliar margens e cláusulas de reajuste antes de janeiro.
A decisão contábil, a partir de agora, também se torna estratégica e comercial.
Checklist de preparação para 2026
Outubro: validar sistemas fiscais e iniciar testes de emissão.
Novembro: confirmar atualização completa e simular o impacto do split payment.
Dezembro: concluir ajustes finais, revisar contratos e preparar plano de contingência para janeiro.
O início da Reforma Tributária em 2026 não será apenas uma mudança legal: será uma transformação operacional profunda.
As empresas que enxergarem esse momento como oportunidade — e não apenas como obrigação — sairão à frente, convertendo conformidade em vantagem competitiva.